Qual o conceito por trás do boi 777?
Quando pensamos em eficiência produtiva, inserida no contexto da pecuária de corte, o termo boi 777, preconizado pelos pesquisadores da APTA de Colina/SP, Gustavo Siqueira e Flávio Resende, logo vem à cabeça. Com esse novo conceito de produção, os pesquisadores propõem o abate de animais com 21 arrobas até os 24 meses de idade.
Como o nome sugere, para alcançar o valor estipulado, seria necessário a produção de sete arrobas em cada uma das etapas da vida do animal – cria, recria e engorda. Sendo assim, para cumprir com o proposto, precisaríamos desmamar um animal com sete arrobas, fazer com que ele ganhe mais sete arrobas durante a recria e depois, mais sete na fase de terminação, tudo isso em menos de dois anos. Daí o termo boi 777.
No entanto, o grande conceito trazido com o boi 777 vai além da produção de sete arrobas em cada uma das etapas produtivas. Frequentemente produtores me questionam sobre os valores preconizados (sete arrobas em cada etapa), alegando que estão produzindo números diferentes dos citados e obtendo sucesso na atividade. Já ouvi produtor falando em boi 8.6.7, boi 8.8.8, boi 7.5.8, e por aí vai.
Como sempre comento: “mais importante do que o número de arrobas a serem produzidas em cada uma das etapas, é a definição da quantidade de arrobas que devem ser produzidas”. Ou seja, mais importante do que as sete arrobas em si, seria a definição de metas produtivas que melhor se adequem à estrutura da fazenda, permitindo sustentabilidade e saúde financeira do negócio.
Porém, definir uma meta produtiva deve ser apenas o start para a elaboração de um plano mais estruturado, uma vez que um valor “solto” não fará muito sentido quando pensarmos em gestão de processos.
Como dito, o grande impacto causado pelo boi 777 vai além do conceito de produzir sete arrobas em cada etapa. Assim, o pecuarista deve começar a ver importância em ter metas, em mensurar e conhecer os resultados obtidos porteira a dentro. Como o próprio professor Gustavo Siqueira diz em suas palestras, citando o Dr. Fernando Cardoso Penteado: “o Brasil ainda é um país onde as pessoas acham muito, observam pouco e não medem praticamente nada”, e é aí que mora perigo.
Não medir significa que estamos supondo e/ou achando, e esse “achismo”, na maior parte das vezes, esconde os problemas que estão ocorrendo porteira a dentro e comprometendo a viabilidade do negócio. Sendo assim, ações de gestão devem começar a compor o dia-dia da fazenda.
Neste sentido, podemos aproveitar um conceito antigo, porém atual, muito utilizado por várias empresas no controle dos processos de gestão, e que se encaixa muito bem por trás do conceito do boi 777: o ciclo PDCA.
Criado na década de 30 pelo americano Shewhart e mundialmente difundido após sua aplicação por Deming em processos produtivos no Japão, o ciclo baseia-se em: planejamento (plan), execução (do), controle (check) e ações corretivas (act) – Figura 1.
O primeiro item do ciclo é o planejamento. De forma simples, planejar é identificar a situação atual, avaliar os caminhos possíveis, construir um referencial (metas), definir limitações impostas e construir um plano de ação. Para isso, o pecuarista pode utilizar algumas perguntas para ajudar a identificar quais os pontos que compõem seu sistema produtivo. Estas perguntas devem ter como objetivo levantar informações da fazenda, de forma geral e por etapas, a longo e curto prazo, como por exemplo: 1) Qual é a produtividade geral a ser alcançada na fazenda? 2) Qual a duração de cada uma das etapas – cria, recria e engorda? 3) Quais as metas produtivas que melhor se encaixam a cada uma delas? 4) Quais os desafios inerentes a cada uma das etapas e qual a relação deles com o cumprimento das metas? Entre outras perguntas.
As respostas devem tem como objetivo elencar pontos fracos e fortes, ameaças e desafios, para que as ações possam ser estruturadas afim de melhorar os pontos fracos, aproveitar as oportunidades e minimizar os riscos das ameaças.
Após construído o plano de ação, deve-se definir os respectivos responsáveis pela condução e execução de cada uma das atividades a serem realizadas. Caso haja necessidade, nesse momento deve ser realizado treinamento e qualificação da equipe responsável por cada uma das atividades definidas.
O segundo item do ciclo é a execução, ou plano de ação do que foi planejado. O sucesso dessa fase está diretamente relacionado a qualidade da elaboração do planejamento e, sobretudo, no treinamento e comprometimento dos responsáveis pela execução de cada atividade. De nada adianta, por exemplo, ter programado uma suplementação estratégica em determinado período do ano, se o produto não chegar ou faltar no cocho.
Sendo assim, as ações devem estar muito claras e definidas, como: o que deve ser feito, porque está sendo implementado, quem será o responsável, onde deve ser executada, quando deve ser implementada, como deve ser conduzida e quanto deve custar?
Seguindo para o terceiro item, temos as ações de controle. Nesse ponto, o objetivo deve ser: verificar se as ações propostas estão cumprindo com seus propósitos, e se os resultados estão sendo alcançados. Para isso devemos adotar um sistema de anotações e registros das principais atividades da propriedade. Essa é uma tarefa que deve ocorrer com certa frequência e de forma continua, afim de que possíveis desvios sejam rapidamente identificados e as devidas correções realizadas em tempo hábil.
Um detalhe muito importante nesse item é a definição dos pontos de controle. Qual a frequência que eles serão checados e como os valores obtidos irão auxiliar na evolução do processo de gestão? Devemos nos atentar ao processo, para não sairmos medindo coisas que não contribuirão com ações futuras, pois isso só demandará trabalho e perda de credibilidade do projeto junto aos colaboradores. O que será medido deverá compor parte da solução do problema e não mais um problema.
O quarto e último item do ciclo PDCA é a ação corretiva. O propósito dessa etapa é solucionar um problema identificado ou definir se as ações continuarão da mesma forma. Esse item também marca o início de um novo ciclo.
Vimos então que por trás de um conceito que vem marcando a pecuária de corte nacional – o boi 777 –, podemos utilizar outro conceito que somará, expressivamente, porteira a dentro, o ciclo PDCA. Dessa forma, passamos a conduzir o negócio como uma empresa, contribuindo com melhorias no processo de gestão e refletindo diretamente no resultado econômico da fazenda.
Caso o assunto PDCA tenha despertado seu interesse, clique nos links abaixo e confira outras publicações referentes ao assunto. Apesar de abordarem outras espécies, a aplicabilidade é a mesma e cabe a você adaptar a sua realidade.
Links:
Gestão EnFoco – Planejamento PDCA: Atuar nos resultados
Gestão EnFoco – Planejamento PDCA: Avaliar
Gestão EnFoco – Planejamento PDCA: Planejamento
Excelente texto, Matheus. A meta é o carro-chefe de qualquer processo de gestão. Porém, como você muito bem disse, é necessário metodologia de gestão e o PDCA é uma ferramenta muito adequada para isso. Parabéns!
Muito bom…