Na avicultura moderna, as penas possuem grande influência no resultado econômico. Observa-se na criação de frango de corte grandes perdas econômicas provenientes das condenações de carcaças nos abatedouros, devido às lesões na pele durante o período de permanência desses na granja. Nas matrizes pesadas, sabe-se que a falta de pena nas fêmeas possui influência negativa nos índices de fertilidade dos ovos, devido às lesões na pele do dorso das fêmeas, causadas pelas unhas dos machos durante o ato da cópula. Perante essa dolorosa lesão, a fêmea não permitirá que o macho tenha o equilíbrio necessário sobre o seu dorso para consumação da cópula. Paralelamente a esse efeito negativo sobre a fertilidade dos ovos, observa-se um aumento nos índices de mortalidade das fêmeas, devido à contaminação bacteriana dessas feridas. Considerando-se a importância acima, o estudo do empenamento e seus componentes precisa ser aprofundado, com o objetivo do desenvolvimento eficiente da criação de aves de corte e postura. Nos próximos parágrafos, destacaremos pontos relevantes do empenamento das aves.
Acredita-se que a pena teve sua origem de pequenos filamentos presentes na pele ou couraça dos dinossauros Terópodes, raptores ancestrais das aves modernas, que habitaram a terra milhões de anos atrás. Essas estruturas tinham a função de ornamentação e proteção do corpo do animal de agressões de agentes externos, como: raios solares, espinhos, perda de água. As penas das aves modernas possuem funções similares às descritas dos répteis bípedes.
Mingke et al (2004) definiram a pena como um órgão epidérmico complexo, com ramos hierárquicos que representam uma transformação topológica multicamada de folhas de queratinócitos. Eles descreveram que os botões da pena se invaginam na derme para formar os folículos de pena e uma sequência de diferenciação celular ocorre para a formação das estruturas da pena. Os autores esclareceram que os folículos das penas são integrados à fisiologia de todo organismo, através de músculos e nervos. Similarmente ao cabelo, a pena possui uma alta capacidade de submeter-se ao ciclo de muda e se regenerar.
Uma pena necessita de aproximadamente 6 semanas para completar seu crescimento. O desenvolvimento dos folículos das penas inicia-se a partir do 5° dia da fase embrionária e estará completamente diferenciado no 16° dia do desenvolvimento embrionário. A quantidade de folículos presente por ocasião do nascimento do pintinho é fixa e não ocorrerá alterações no número destes durante a vida da ave. Curiosamente, a temperatura de incubação possui forte influência sobre a formação dos folículos na fase embrionária e, posteriormente, na qualidade do empenamento. De acordo com alguns autores, temperaturas de incubação acima de 38°C são prejudiciais à formação dos folículos das penas durante a fase do desenvolvimento embrionário.
Observa-se nas aves com idade abaixo de 5 semanas um empenamento denominado penugem; na idade entre 6 – 12 semanas o empenamento é denominado juvenil e, finalmente, o desenvolvimento do empenamento adulto é observado entre 13 – 20 semanas; após essa idade o empenamento das aves é considerado completamente formado. O empenamento nesse estágio sofrerá processo gradual de renovação, denominado de muda, que ocorrerá durante toda a vida da ave. A intensidade desse processo de renovação sofre influência direta de fatores intrínsecos à fisiologia da ave ou externos, como: alimentação, ambiente, etc.
As penas são classificadas em cinco tipos básicos, considerando-se sua estrutura: penas de contorno (penas grandes), semiplumas, plumas, cerdas e filoplumas. O peso do conjunto de penas corresponde a aproximadamente 4% do peso corporal de uma ave e protege 75% da área total da pele. Uma ave adulta possui aproximadamente 8.000 penas de cobertura, sendo que 60% destas cobre o corpo da ave em si e os outros 40% cobre o pescoço e membros da mesma.
A qualidade do empenamento é dependente do sexo e idade das aves. Em uma população de aves, o empenamento dos machos é pior que das fêmeas e o empenamento de aves mais jovens é pior que aquele observado em aves com idade mais avançada.
Composição da pena
Anatomicamente, uma pena possui uma estrutura oca que fica inserida na pele (cálamo), raque ou eixo principal, barbas que são ramificações da raque e as barbulas entrelaçadas que estão fixadas nas laterais das barbas; conforme a figura abaixo:
As penas, nutricionalmente, possuem função de relevância para as aves. Na literatura, é unânime que aves com menor quantidade de penas possui uma maior demanda energética para sua manutenção corporal. Assim, qualquer fator externo que contribua para redução da qualidade do empenamento deve ser classificado como fator negativo para o resultado econômico de um lote de matrizes pesadas ou frango de corte.
A composição da pena é de aproximadamente 95% de proteína, enquanto na composição corporal observa-se apenas 21% de proteína. Portanto, a síntese da estrutura da pena possui uma demanda elevada de proteína, principalmente de aminoácidos sulfurados. Pode-se afirmar que os aminoácidos: leucina, cistina (forma mais estável da cisteína), arginina e valina contribuem com: 7,3 – 7,8; 7,1-7,8; 6,3 – 6,8 e 5,8 – 6,2% da composição da pena; por outro lado, observa-se que a histidina e triptofano são os aminoácidos de menor presença nas estruturas das penas, sendo de: 0,8 – 1,2% e 0,7 – 0,9%, respectivamente. Curiosamente, a cistina, que pode atingir até 7,8% da composição da pena conforme citado acima, tem presença próxima de 1% apenas nos tecidos corporais. Alguns trabalhos relatam uma alta correlação entre o nível de metionina e cistina na formulação das rações e a qualidade do empenamento em aves. A composição dos aminoácidos das penas é bastante estável durante a fase de crescimento das aves, sendo verificados pequenos aumentos nos percentuais de treonina, valina, leucina e uma pequena redução no percentual de metionina.
Citações da literatura descrevem que o canibalismo em poedeiras é inibido quando o nível de metionina digestível eleva-se de 0.22 para 0.36% nas formulações de rações. Alguns trabalhos mencionam uma correlação positiva entre os aumentos lineares do nível de lisina digestível e a qualidade do empenamento das aves. Portanto, a redução muito forte do nível de proteína bruta nas rações poderá resultar em níveis marginais de lisina digestível e, também, dos outros aminoácidos que possuem como referência esse aminoácido.
Entre os minerais, a literatura destaca o selênio e o zinco como os que possuem maior relevância para o empenamento, sendo o primeiro classificado como um excelente antioxidante, com capacidade de amenizar os efeitos deletérios de situações de estresse sobre o empenamento. Os autores afirmam que aves alimentadas nas primeiras 5 semanas de vida com rações contendo selênio na forma orgânica, ligados com levedura, metionina ou cisteina, que possuem melhor biodisponibilidade em relação ao selênio inorgânico, terão efeito benéfico ao empenamento dessas.
Manejo de arraçoamento e o empenamento das aves
Peguri A. & Coon C. (1993) realizaram um experimento com 3 grupos de aves: no grupo 1, as aves tinham 100% de cobertura de penas; grupo 2, as aves tinham 50% do escore de penas do grupo 1. No grupo 3, em relação ao grupo 1, foram classificadas com escore 0% de cobertura de penas. As aves dos tratamentos foram alojadas em 3 temperaturas: 12,8; 23,9 e 33°C. Eles observaram que, independente da temperatura, a ingestão de ração diária aumentou em 26,5% nas aves com escore 0% de cobertura de penas, em relação às aves do grupo 1. Os autores verificaram uma eficiência energética (EM) crescente com o aumento da cobertura de penas das aves.
Tabela 1. Exigência média de EM de mantença (Kcal/Kg PV) de aves com 0,50 e 100% de cobertura de pena durante 6 semanas, sob temperatura de 12,8; 23,9 e 33,9°CDe acordo com os dados da tabela 1, em uma mesma temperatura, o gasto energético de mantença aumenta com a redução da cobertura de penas. Dentro do mesmo escore de empenamento, quando a temperatura ambiente reduz, ocorre uma elevação na demanda de energia metabolizável de mantença. Similarmente a esse trabalho, Glatz D.C (2001) observou que aves com 50% de quantidade de penas (pobre empenamento) consumiram, significativamente, 16% a mais de ração em relação às aves do grupo 1, classificadas com 100% de penas ou empenamento ideal. Considerando-se as informações da tabela 1, pode-se afirmar que, independente da temperatura, o escore de empenamento possui um efeito positivo sobre o gasto médio energético metabolizável destinado à mantença corporal das aves.
De acordo com relatos de literatura, dietas contaminadas com substâncias tricotecenos, substância tóxica produzida pelos fungos fusarium e micotoxina T2, possuem efeitos deletérios sobre as penas.
Temperatura °C | Cobertura de penas (%) | Média das temperaturas | ||||||
100 | 50 | 0 | ||||||
EM kcal/kg Pv | ||||||||
12,8 | 110C | 147b | 190a | 149p | ||||
23,9 | 99d | 116c | 137b | 117Q | ||||
33,9 | 71e | 80e | 99d | 83w |
Adaptada de Peguri & Coon (1993)
Anormalidades relacionadas ao empenamento
O aparecimento de Feather Pecking (FP) ou tendência de lamber penas (TLP) e canibalismo são classificados como desvios de comportamento das aves. Os fatores causadores desses desvios são classificados como diretos e indiretos, sendo os fatores ligados à nutrição em si considerados diretos; e os demais fatores considerados como indiretos. De acordo com a literatura, a redução da conduta fisiológica do banho de poeira das aves e uma diminuição da procura de partículas presentes no piso do galpão são fatores de estresse, desencadeadores dos desvios comportamentais da TLP e canibalismo. Além desses fatores causadores de estresse, são citados outros fatores com capacidade de desencadear TLP e canibalismo nos lotes de matrizes pesadas.
- Fatores nutricionais: A deficiência de alguns aminoácidos, entre eles: cistina e arginina, minerais (sódio, cloro, magnésio e cálcio), proteína e presença reduzida de fibra nas rações poderão desencadear TLP e canibalismo nas aves;
- Fatores ambientais: Lotes de matrizes pesadas com tendência genética para desenvolver TLP e canibalismo são estimulados a desenvolver tais desvios de comportamentos quando submetidos à luminosidade acima de 10 luxes durante suas recrias;
- Estrutura dos galpões: Alguns autores citam uma correlação positiva entre a área com cama no galpão, onde as aves poderão realizar banhos de poeira e procurar partículas pequenas presentes nessa cama e, também, a presença de poleiros, principalmente na recria, e a qualidade do empenamento. A explicação seria que esses fatores, proporcionalmente, são capazes de reduzir o estresse das aves, podendo desencadear o desvio comportamental da TLP;
- Fatores sociais: Autores verificaram que a manifestação da TLP é maior em aves mantidas em gaiolas em relação aquelas mantidas em área de piso, onde as aves podem realizar o banho de poeira e realizarem a procura e apreensão de partículas presentes na cama. De acordo com eles, existe uma correlação positiva entre a TLP e o número de aves alojadas por metro quadrado de piso de galpão;
- Socialização das aves: Em aves jovens a TLP é considerada, por pesquisadores, como um ato de socialização; no entanto, esse ato tornara-se um problema com o avanço da idade em lotes de aves submetidos a fatores de estresse, como: condições ambientais inadequadas ou desvio social entre as aves;
- Fatores genéticos: A propensão do aparecimento da tendência de lamber as penas (TLP) é fortemente influenciada pela linhagem das aves. Autores citam que, dentro de um lote de matrizes, apenas 8-9% das aves são responsáveis por 50% do desvio de comportamento da TLP. Existe uma afirmativa na literatura que diz que a seleção das aves para a produtividade possui forte correlação com o aparecimento da TLP, ou seja, lotes com tendência de produção muita elevada têm maior possibilidade de aparecimento de TLP. Aves com alta TLP gastam muito tempo realizando a limpeza de suas penas, enquanto as aves com menor TLP possuem tempo prolongado procurando partículas na cama do galpão. Isso evidência que o comportamento individual de cada ave dentro do ambiente de alojamento possibilitará, ou não, o aparecimento da TLP dentro da população ou lote de aves.
Dietas ricas em fibras insolúveis, como observado no farelo de trigo, têm sido utilizadas em matrizes pesadas, no esquema de alimentação restrita, com objetivo de oferecer um maior volume de ração nos comedouros e um tempo de consumo da ração mais prolongado. A presença dessas fibras no trato intestinal das aves favorecerá a saciedade, reduzindo os riscos de canibalismo.
A forma da ração e sua relação com empenamento das matrizes pesadas
As matrizes pesadas recebem um volume restrito de ração, diariamente. Sabe-se que o mesmo peso de uma ração na forma física farelada ocupa um maior volume em um recipiente quando comparado à ração na forma física peletizada. Isso porque o processo de peletização possui a capacidade de compactar as partículas componentes das rações. De maneira similar, a afirmativa que diz que pesos iguais desses dois tipos de rações possuem tempos de ingestão diferenciados pelas matrizes pesadas, principalmente na fase de recria. Rações que possuem volumes maiores, também, possuem tempos de ingestão maiores. Os tempos de ingestão das rações e ociosidade das aves são inversos. Nas matrizes pesadas, proporcionalmente, quanto maior o tempo de ociosidade das aves maior será a possibilidade de aparecimento de canibalismo. Esse distúrbio de comportamento ocorre devido ao aumento da agressividade ou bicadas entre as aves nesses lotes. Considerando-se esse contexto, pode-se afirmar que o empenamento de um lote de matriz pesada que ingere ração farelada com tempo menos ocioso dentro do galpão é melhor em comparação ao empenamento de outro lote que recebe ração peletizada com esse tempo ociosidade mais prolongado.
Seleção genética e a importância do empenamento para as matrizes pesadas
A melhoria da qualidade das penas das aves possui prioridade alta nos programas de seleções genética. Nesses programas, as mutações genéticas, que possuem correlação negativa com o empenamento, são constantemente eliminadas. A quantidade de penas, devido à sua herdabilidade (h2) que varia entre 0,07 – 0,38, é favorecida pela seleção das aves. Os selecionadores de genética desenvolveram escores de empenamento que são considerados durante a seleção das aves dentro dos seus programas de seleção. A área da coxa é uma das partes da ave que demanda grande atenção durante o desenvolvimento desses programas de seleção genética, pois possui pouca cobertura relativa de pena; sendo, por isso, extremamente sujeita às lesões por fatores extrínsecos que comprometem a sua qualidade. Essa situação possui um efeito negativo sobre o rendimento de carcaça das aves nos frigoríficos.
Conforme descrito neste artigo, a qualidade do empenamento possui forte influência nos resultados zootécnicos na avicultura industrial. A nutrição das aves, estruturas dos galpões, fatores ambientais e manejo, de maneira direta ou indireta, possuem pesos elevados na qualidade do empenamento das aves. Portanto, essas variáveis e os programas de seleção genética são essenciais para o sucesso da criação de aves destinadas à produção de ovos ou pintos.
Muito interessante o artigo sobre empenamento, escrito por Marco Fiuza.