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Estratégias para minimizar os efeitos do estresse calórico em fêmeas lactantes

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Estratégias para minimizar os efeitos do estresse calórico em fêmeas lactantes

A suinocultura está relacionada à cinco princípios básicos, sendo eles o manejo, sanidade, nutrição, genética e ambiência, e deve-se atentar principalmente a este último quando se trata de conforto térmico das fêmeas lactantes. Quando o assunto é ambiência, é preciso levar em conta quatro elementos climáticos: a radiação, corrente de ar, temperatura e umidade do ar e se não forem monitorados, podem impactar diretamente na saúde e bem-estar animal (BELHADJ SLIMEN et al., 2016), afetar negativamente o desempenho produtivo e reprodutivo dos animais (AL-ZGHOUL et al., 2019) e acarretar em grandes perdas econômicas (ALVARENGA et al., 2011).

Figura 1. Zona termo neutra da fêmea suína lactante.

Para matrizes lactantes, considera-se como zona de conforto térmico de 18 a 22 ºC, e umidade relativa do ar de 40 a 70% (BORTOLOZZO et al., 2011). A hipotermia ocorre quando a temperatura corporal fica abaixo do limite fisiológico normal e a hipertermia ocorre quando a temperatura corporal fica acima do limite fisiológico normal. E para quando o animal mantém a temperatura corporal constante, ou seja, dentro do intervalo da zona termo neutra, chama-se homeotermia (FÁVERO et al., 2003). Quando as matrizes são mantidas em ambientes com temperaturas acima da faixa de conforto térmico ocorrem alterações comportamentais, fisiológicas e metabólicas para mantê-las em homeotermia, sendo possível observar altas taxas respiratórias, aumento das temperaturas da superfície corporal, retal e do úbere, menor consumo de ração e prolongamento da duração do parto. Por outro lado, quando as matrizes são mantidas em ambientes com temperaturas dentro da faixa de conforto, observa-se maior ingestão de ração, fêmeas mais calmas e maior peso de desmame (MUNS et al., 2016).

O Brasil é considerado um país tropical e a sazonalidade do clima brasileiro apresenta grande impacto na produção suinícola (BLACK et al., 1993). Considera-se que, no Brasil, o estresse por calor tem um alto impacto econômico na suinocultura, principalmente por causar redução no desempenho produtivo das matrizes suínas, gerando prejuízos próximos de U$ 113 milhões por ano (SOUZA et al., 2020). Para os suinocultores, além de representar alto custo, há uma dificuldade em adequar as instalações devido, muitas vezes, à estrutura ser antiga, à topografia da área e por não haver espaço suficiente para adequação e/ou ampliação das instalações. Mas algumas medidas podem ser tomadas para minimizarmos os efeitos causados pelo calor nas matrizes suínas.

Se a instalação estiver sendo planejada, é necessário que seja feito um estudo minucioso do clima do local onde será construída, sendo, possível projetar instalações aptas a minimizarem os efeitos deletérios do clima sobre os suínos. É importante verificar se há espaço disponível e topografia local, assim como a presença de barreiras naturais ou artificiais, controle da temperatura (máxima e mínima), umidade do ar, direção e intensidade do vento e, não menos importante, a orientação solar (CAMPOS ET AL., 2002). Vale ressaltar que os pontos supracitados devem estar respaldados pela legislação em vigor e das normas de proteção ambiental e bem-estar animal.

Em relação à localização, é preferível a escolha por lugares que permitam aproveitar as vantagens da circulação natural do ar, como por exemplo locais que possuam topografia plana ou levemente ondulada, (FÁVERO et al., 2003; BONETT & MONTICELLI, 2014). O espaçamento entre as instalações é um fator muito importante a ser considerado e deve ser suficiente para permitir a livre circulação do ar. É recomendável trabalhar com um espaço entre o primeiro e segundo galpão de dez vezes a altura do primeiro galpão, e um espaçamento entre o segundo e terceiro galpão de 20 a 25 vezes a altura do primeiro (Figura 2). Em situações em que o espaçamento entre galpões não está adequado, uma instalação se torna barreira artificial para outra impedindo a circulação do ar impactando diretamente na ventilação dos galpões. Neste caso, para buscar minimizar esse problema, realizar adequadamente a manutenção das árvores mantendo limpo as áreas entre os galpões e realizar um manejo de cortinas conforme a temperatura interna e correntes de ar pode auxiliar na melhor ventilação entre os galpões. Uma alternativa, é recorrer a ventilação foçada de pressão positiva (ventiladores) com intuito de melhorar e climatizar o ambiente interno.

Figura 2. Espaçamento entre galpões.

A orientação solar é outro ponto que possui grande influência na temperatura ambiental interna. Avaliar o trajeto do sol e planejar a construção de forma com que o sol siga o eixo longitudinal dos barracões, no sentido Leste-Oeste. Dessa forma, é possível reduzir a incidência do sol dentro das instalações ou diretamente sobre as matrizes nas horas mais quentes do dia (Figura 3) (FÁVERO et al., 2003, BRIDI, 2007).

Figura 3. Orientação solar, sentido Leste-Oeste.

Após a avaliação dos fatores ambientais e características do local, é possível partir para o planejamento estrutural e definir as características construtivas dos galpões. Para definição da largura da instalação é necessário avaliar juntamente o clima local, número de animais a serem alojados, dimensionamento e disposições das baias. Para regiões com clima quente e úmido, normalmente se recomenda largura de até 10 metros, já para regiões com clima quente e seco, habitualmente, é utilizado largura de 10 a 14 metros (FÁVERO et al., 2003).

Com base no planejamento de produção e na topografia, é possível definir o comprimento do galpão,  sendo necessário muita atenção para evitar problemas futuros com terraplanagem e distribuição de água (ABREU & ABREU, 2000). A altura do pé direito da instalação terá influência sobre a ventilação e na quantidade de calor vinda da cobertura sobre os animais, estando entre os pontos mais importantes para o planejamento. Manter os suínos à uma distância suficiente da superfície inferior da cobertura ajudará a reduzir a quantidade de energia calórica que os animais receberão na superfície do corpo. Para isso, é sugerido trabalhar com no mínimo 3,5 metros de altura do pé direito em regiões quentes (FERREIRA, 2012). Já Fávero et al. (2003) sugerem, como regra geral, trabalhar de 3 a 3,5 metros.

O tipo de material (madeira, metal ou pré-fabricado de concreto) a ser utilizado na cobertura terá influência sobre a energia radiante que chegará sobre os animais, e a escolha por materiais com grande resistência térmica ajudará a minimizar esse efeito. Para melhorar a eficiência da cobertura pode ser realizado a combinação do material com uso de isolantes térmicos (poliuretano, poliestireno extrudado, lã de vidro, manta asfáltica), segunda barreia física (forro), pinturas ou lanternim (FÁVERO et al., 2003; DIAS et al., 2011).

O uso de vegetações circundando os galpões auxilia na redução da radiosidade e da temperatura interna dos galpões (Figura 4) (CAVALHEIRO, 1994; FÁVERO et al., 2003 NÄÄS & JUSTINO, 2014). Há algumas plantas recomendadas para essa finalidade, e o ideal é a escolha por árvores caducifólias ou decíduas, ou seja, que mantém suas folhas durante o verão e que perdem suas folhas no inverno. O objetivo é fazer com que no inverno, quando suas folhas caem, ocorra uma maior incidência de sol permitindo o aquecimento da cobertura e no verão reduzir a incidência do sol, auxiliando no controle da temperatura interna. Ao longo dos anos, é necessário a manutenção e poda destas árvores, no qual é realizado a remoção dos galhos mais baixos que impediriam a circulação do ar e manutenção da copa. Assim como o uso de árvores, o plantio de grama circundando toda a estrutura auxilia na manutenção da temperatura, além de evitar erosões e facilitar a penetração da água da chuva.

Figura 4. Arborização para sombreamento dos galpões.

Sistemas de refrigeração é uma excelente opção para melhorar a ventilação no ambiente ou até manter a temperatura estável e dentro do conforto térmico das matrizes lactantes (FÁVERO et al., 2003 NÄÄS & JUSTINO, 2014). O maior controle da temperatura dos galpões possibilita o melhor consumo de ração pelas matrizes e maior disponibilidade nutricional e, consequentemente, menor mobilização corporal dos tecidos para suprir a demanda necessária para manutenção corporal e de sua leitegada. Há diversos modelos de sistemas de refrigeração, cada um com suas particularidades. Para definir qual sistema utilizar, é necessário realizar uma avaliação geral do galpão com objetivo de definir qual sistema será mais efetivo e condizente com determinada estrutura.

Em galpões que não permitam grandes mudanças estruturais e/ou investimentos, devemos recorrer a outros meios como por exemplo a adaptação de equipamentos. Há alguns sistemas de refrigeração que não necessitam de grandes mudanças na estrutura. A adaptação de ventiladores, gotejamentos, resfriamento axial do ar na nuca das fêmeas são algumas dessas possibilidades para reduzir o estresse calórico (GAVA et al., 2010). A atenção com a qualidade da água e seu sistema de distribuição de água e readequação de manejos são outras possibilidades de buscar contornar os efeitos causados pelo estresse calórico.

A água é considerada um dos nutrientes mais importantes na suinocultura, e quando fornecida adequadamente auxilia na manutenção das funções do organismo (JEON et al., 2006). Como os suínos são animais homeotérmicos, possuem poucas glândulas sudoríparas e espessa camada de gordura, a disponibilidade de água fresca, de qualidade e à vontade ajuda a matriz a controlar a temperatura corporal, e consequentemente, reduzir o estresse calórico e seus efeitos negativos sobre o desempenho produtivo. Deve-se posicionar as caixas d’água em locais sombreados, realizar a limpeza periódica destas caixas, criar uma rotina de análise laboratorial da água, realizar a passagem da tubulação por paredes que haja menor incidência de sol e manutenção dos bebedouros vão auxiliar na disponibilidade de água de qualidade para o consumo dos animais.

A adequação dos horários de arraçoamento e/ou o fracionamento são estratégias para minimizar os efeitos do estresse calórico, então realizar o trato nos horários mais frescos do dia, início da manhã e final da tarde, ou até implantar um trato a mais durante à noite é uma forma de estimular o consumo de ração. O ato de umedecer a ração no momento do arraçoamento é outra forma de estimular o consumo e tem mostrado resultados significativos na produtividade das matrizes (GENEST & D´ALLAIRE, 1995; QUINIOU et al., 2000b).

O uso de sistemas de eletrônicos de alimentação têm se tornado uma ferramenta útil que permite distribuir o consumo diário em diferentes porções estimulando o aumento da ingestão total de ração, permitindo também a inclusão de arraçoamento durante o período da noite ou nos horários mais frescos do dia, reduzindo os efeitos do estresse calórico na produtividade das fêmeas lactantes (RUTLLANT, 2020). Com esta tecnologia é possível ajustar o fornecimento de ração conforme a necessidade individual das fêmeas (ordem de parto, dias de lactação) e monitorar precisamente e em tempo real o consumo individual possibilitando identificar aqueles indivíduos que apresentem consumo abaixo da curva definida e reduzir as perdas produtivas causadas por altas temperaturas. Além de permitir ajustar o consumo da fêmea conforme a necessidade e conforme o clima, esta tecnologia apresenta grande impacto na economia de ração por conta do baixíssimo desperdício.

A ingestão reduzida de ração e consequentemente de lisina digestível e outros nutrientes podem impactar na mobilização de diferentes tecidos corporais acarretando queda na produção de leite com redução no potencial de crescimento dos leitões e peso das leitegadas (YANG et al., 2000; LI et al., 2000), podendo também ocorrer aumento da mortalidade e redução no número de leitões desmamados (HURLEY, 2001). Relacionado a isso, ocorre um maior desgaste da fêmea durante a lactação reduzindo o desempenho produtivo e reprodutivo, nos ciclos posteriores (TOUCHETTE et al., 1998), como aumento do intervalo desmame-estro e dos dias não produtivos (HAESE et al., 2010). Em épocas de altas temperaturas, período este em que a fêmea reduz o consumo de ração, trabalhar com uma formulação mais concentrada e com níveis adequados de proteínas, amido e gordura, tem como objetivo fazer a fêmea ingerir as necessidades nutricionais diárias e reduzir a produção de calor endógeno. Essa concentração da ração, com redução de proteína bruta associada a inclusão de aminoácidos essenciais, mantendo o equilíbrio da dieta, pode ser uma boa alternativa para matrizes alojadas em ambientes com altas temperaturas (RENAUDEAU et al., 2001).

Os aromatizantes e palatabilizantes têm com uma de suas funções o estímulo de consumo de ração pelos animais. Segundo Silva et al. (2020), o uso de aromatizantes na ração pode estimular o consumo voluntário pela porca e mitigar as demandas da lactação. Em seu estudo, observaram que o grupo que recebeu ração com aromatizante apresentou até 24% a mais de consumo em relação ao grupo que consumiu ração sem aromatizante. Em um segundo estudo, foi utilizado um sistema automático de alimentação (gestal) para avaliar o impacto da suplementação dietética com o mesmo aroma na alimentação de porcas em lactação, no comportamento alimentar e na cinética de ingestão diária em condições tropicais. Foi verificado que as fêmeas que receberam ração com adição de aromatizante consumiram 6.417 gramas/dia, enquanto o grupo controle teve um consumo de 5.362 gramas/dia (SILVA et al., 2020).

Geralmente, esse quadro de hipertermia também leva à redução na atividade enzimática (superóxido dismutase, catalase, glutationa peroxidase) e de outras moléculas com propriedades antioxidantes (Vitaminas A, C e E, bilirrubina, ácido úrico, cisteína e GSH) responsáveis pelo combate aos excessos de radicais livres presentes no organismo (BARREIROS et al., 2006). A deficiência orgânica desses elementos com atividade antioxidante resulta em um quadro de estresse oxidativo, danificando moléculas e membranas biológicas, causando alterações na fisiologia e no desempenho dos animais (SURAI, 2002; SHI-BIN et al., 2007; RAHAL, et al., 2014; SZCZUBIAL, 2015). Frente a minimização dos efeitos do estresse oxidativo, a suplementação dietética com substâncias antioxidantes vem sendo uma das principais ferramentas de controle estudadas na comunidade científica. A suplementação dietética de α-tocoferol-selênio (Vitamina E) e ácido ascórbico (Vitamina C) para fêmeas durante a fase lactacional têm apresentado expressiva redução no estresse oxidativo e redução nos níveis de cortisol, aumento das concentrações séricas de imunoglobulinas e redução na taxa de mortalidade de leitões (GAYKWAD et al., 2019). A vitamina C é um dos antioxidantes biológicos mais eficientes e sua disponibilidade no tecido pode ser ajustado de acordo com mudanças na dieta (SHANG et al., 2002).

Conclusão

O estresse térmico possui grande influência no desempenho produtivo e reprodutivo das matrizes suínas em lactação. Animais submetidos a esse estresse passam por alterações comportamentais e fisiológicas, impactando diretamente no consumo de água e ração e consequentemente apresentam queda na produção de leite e redução no potencial de crescimento de suas leitegadas, apresentando queda na produtividade e influenciando diretamente na saúde financeira da granja. Assim sendo, torna-se necessário e indispensável a implantação de ações e estratégias que sejam eficientes na mitigação dos efeitos do estresse calórico e que minimizem as perdas produtivas e econômicas dos produtores suinícolas.

Referências

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Nutrição Animal – Agroceres Multimix

Co-autor:

Prof°Dr. Ivan Bianchi
Coordenador e Professor do Curso de Pós-Graduação “Mestrado Profissional em Produção e Sanidade Animal” no Instituto Federal Catarinense (IFC), Campus Araquari.

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