As últimas décadas foram marcadas pela rápida evolução na cadeia avícola, principalmente quando se trata de melhoramento genético. As aves se tornaram mais eficientes, o que se expressa através do alto desempenho produtivo, que é totalmente dependente da absorção adequada de nutrientes pelo organismo animal.
Para que as aves possam expressar todo seu potencial genético é essencial que a saúde intestinal esteja equilibrada, com todas as suas características estruturais e fisiológicas em perfeita sintonia. Isto é, todos os processos de absorção são dependentes dos mecanismos de transporte, que ocorrem na membrana das células epiteliais da mucosa, e qualquer alteração em sua integridade pode provocar falhas no desenvolvimento da ave.
A saúde intestinal depende da atuação conjunta de funções fisiológicas, microbiológicas e físicas para a manutenção do correto equilíbrio do intestino e é considerada um dos fatores de grande impacto na indústria avícola.
Sabemos que existem inúmeros fatores, incluindo dieta, linhagem, condições ambientais, práticas de manejo, entre outros, que podem afetar o microbioma intestinal. Destes, a composição da dieta é o principal fator que pode influenciar diretamente a natureza da microbiota da ave, uma vez que alguns componentes presentes nas dietas ofertadas às aves podem influenciar positivamente no desenvolvimento da mucosa intestinal.
Recentemente, muitas estratégias estão sendo empregadas visando a modulação da microbiota intestinal de maneira eficaz, entre elas, a suplementação de fontes de fibras. Ingredientes alternativos e coprodutos são tipicamente ricos em fibras e podem ser utilizados nas dietas, não só com o intuito de reduzir custos produtivos, como também para a melhoria da saúde intestinal.
As fibras são encontradas na parede celular dos vegetais, sendo definidas como uma mistura complexa de polímeros de carboidratos (polissacarídeos não amiláceos – PNAs – e oligossacarídeos). Os PNAs são os principais componentes da fibra presente nos cereais e caracterizam-se por apresentarem macromoléculas, unidas por ligações glicosídicas resistentes às reações de hidrólise enzimática, que ocorrem no trato gastrintestinal dos animais monogástricos.
Fibras Solúveis e Insolúveis
As propriedades físico-química das fibras incluem solubilidade, capacidade de retenção de água, viscosidade e gelificação, além de capacidades de ligação, volume e fermentabilidade.
Baseando-se nessas características, as fibras são divididas em duas frações:
- solúvel (pectinas, gomas, mucilagens e alguns tipos de hemiceluloses e polissacarídeos de reserva da planta) e
- insolúvel (celulose, hemicelulose insolúvel e lignina).
Porém, ainda há controversas sobre o melhor tipo de fibra a ser fornecido para os animais, já que podem atuar de formas distintas no metabolismo das aves.
As propriedades antinutricionais dos PNAs estão principalmente nas frações solúveis das fibras, sendo caracterizadas pela capacidade de:
- absorver água,
- promover viscosidade da digesta,
- alterar a velocidade da taxa de passagem e
- interferir na difusão dos nutrientes/enzimas digestivas.
Já a fração insolúvel, devido a suas propriedades de insolubilidade em água, permanece mais tempo na moela, permitindo, assim, uma taxa de passagem que promova maior contato da digesta com as enzimas, favorecendo o aproveitamento das proteínas presentes na dieta.
As aves necessitam de uma certa quantidade de fibra para que suas funções fisiológicas ocorram, e a incorporação de quantidades entre baixas a moderadas demostra impactar no desenvolvimento e fisiologia digestiva.
Pesquisas destacam efeitos positivos sobre o desenvolvimento e funcionalidade da moela, pois, através da atividade de maceração e retenção do alimento no órgão, ocorre um acréscimo da superfície de contato dos nutrientes com as secreções gástricas, assim como dos refluxos gastrointestinais, que propiciam maior tempo de ação das enzimas digestivas na parte superior do trato digestivo.
Além disso, acredita-se que, com o acúmulo de fibras na moela é desencadeada uma sensação de saciedade, reduzindo o estresse, comportamentos de bicagem de penas e canibalismo.
Como são resistentes à digestão enzimática no trato gastrintestinal dos animais, as fibras beneficiam o metabolismo e funcionamento do intestino. Ao chegar no colón, são fermentadas por bactérias intestinais, contribuindo com a produção de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC). Estes:
- atuam como fonte de energia para a mucosa,
- auxiliam na proliferação de enterócitos,
- potencializam a área absortiva do intestino,
- além de serem capazes de impedir o desenvolvimento de bactérias patogênicas no intestino.
Além dos efeitos mencionados, podem auxiliar no crescimento e estabelecimento de bactérias benéficas no trato gastrointestinal, fornecendo-lhes substratos para extrair energia e alimentar seu metabolismo. Estas bactérias presentes como parte do microbioma intestinal também podem produzir metabólitos como bacteriocinas, que fornecem atividade protetora.
Desta forma, as fibras podem ser consideradas ferramentas na modulação intestinal, principalmente quando são adicionadas junto com enzimas exógenas, reduzindo suas propriedades antinutricionais e contribuindo para melhorar aspectos produtivos.
No entanto, determinar as fontes, a granulometria, o tipo e nível de inclusão são pontos importantes para alcançar estas respostas, assim como ter uma visão mais abrangente de como transformar esses componentes em estratégias nutricionais.