O gérmen do milho é um coproduto originado a partir do processamento do milho pela indústria alimentícia e de combustível. Essas indústrias têm como foco o uso do amido do grão, sendo que, durante o processamento para derivar as matérias-primas de interesse, o gérmen do grão acaba sendo separado, tornando-se apenas um resíduo para essas empresas.
O que é o gérmen?
O gérmen compõe, aproximadamente, 11% do grão de milho e nele estão contidos a maior parte dos lipídios (83% – óleo e vitamina E) e minerais (78%), além de ser composto por uma quantidade considerável de proteínas (26% – albuminas, globulinas e gluteínas) e açúcares (70%). No gérmen do milho está contido o embrião, assim como a reserva nutritiva para seu desenvolvimento. A fração lipídica do gérmen do milho apresenta elevada quantidade de ácidos graxos (com maior concentração de insaturados), são eles: linoleico (56%), oleico (28%), palmítico (11%) e esteárico (2%), linolênico (1,5%) e araquidônico (0,5%).
Todos os coprodutos originados através do processamento do milho podem ser obtidos através de 2 processos: moagem seca e moagem úmida. O gérmen é obtido através de uma etapa, que ocorre em ambos os processos, chamada de degerminação.
Processos que originam o gérmen
Na moagem via seca, a degerminação do grão de milho é feita através de atrito mecânico, separando o grão em amido, pericarpo e gérmen. A eficiência do processo de degerminação é medida de acordo com o rendimento das frações de gérmen, pericarpo e amido obtidos e, muitas vezes, esse processo não oferece uma matéria-prima padronizada, devido à variabilidade do milho (tamanho do grão, variedade, entre outros) e dos moinhos (potência, velocidade, entre outros). O objetivo da degerminação é obter a maior quantidade de amido possível, separando-o ao máximo das demais partes do grão. Dessa forma, o gérmen obtido terá uma grande concentração de óleo, originando o gérmen integral (gérmen gordo).
Já na moagem por via úmida, antes da etapa de degerminação, ocorre a chamada maceração, que tem a função de “amolecer” a matriz proteica do grão, facilitando a extração do amido, através da inclusão de água quente (cerca de 50°C) e dióxido de enxofre (0,1 a 0,2%). Depois do processo de maceração, o amido passa por uma moagem grosseira, originando uma pasta com gérmen, película, amido e glúten. Essa pasta passa por uma centrifugação e, devido à diferença de densidade, o gérmen é separando dos demais componentes. Após essa etapa, o gérmen de milho pode ser comercializado como gérmen integral, também chamado de gérmen “extra gordo”, ou passar pelo processo de extração do óleo, utilizando processos hidráulicos e solventes e posterior secagem, que originará o gérmen desengordurado, que também pode ser utilizado na nutrição animal, se apresentando como um alimento mais fibroso e menos energético, muito utilizado em dietas de monogástricos.
De acordo com processamento do milho (via seca ou via úmida) o gérmen de milho poderá apresentar diferentes quantidades de lipídios, sendo que, no processamento por via seca, o gérmen do milho obtido apresenta menor quantidade de óleo quando comparado ao gérmen proveniente pela via úmida, isso porque, uma parte do pericarpo e endosperma não consegue ser retirada, diminuindo então a concentração lipídica no produto. A moagem por via úmida origina maior variabilidade de coprodutos e com maior valor agregado no mercado.
Uso do gérmen de milho na alimentação de bovinos de corte
Energeticamente, o milho e o gérmen apresentam teores próximos de NDT (milho aproximadamente 88% e gérmen integral 89%) porém, a forma como cada um disponibilizará energia para o animal é diferente.
Quando utilizamos milho na formulação, a energia obtida pelo animal virá a partir da fermentação do amido no rúmen, resultando na produção dos ácidos graxos de cadeia curta. Por outro lado, quando utilizamos o gérmen de milho, grande parte da energia produzida para o animal virá através o uso da sua gordura.
Como nutricionistas, é essa diferença básica que precisamos entender para, a partir dela, discorrer sobre como adequar a formulação, pensando nos efeitos desencadeados no rúmen com o uso de um ou do outro ingrediente.
Tabela 1. Composição química do milho, gérmen integral de acordo com o tipo de processamento do milho (gérmen gordo e extra gordo) e gérmen desengordurado, com base na matéria seca
Publicações | %MS | %PB | % EE | % FDN | % CNF |
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NRC (2001) | 88 | 9,1 | 4,0 | 9,5 | 76,4 |
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Castro (2007) | 83,2 | 12,9 | 15,6 | 21,2 | 46,7 |
Adbelqader et al. (2009a) | 95,0 | 15,8 | 19,9 | 22,8 | 36,0 |
Adbelqader et al. (2009b) | 94,0 | 15,8 | 20,0 | 24,5 | 36,0 |
Castro et al. (2009) | 83,3 | 19,7 | 11,6 | 18,8 | 43,1 |
Miotto et al. (2009) | 83,2 | 12,9 | 15,6 | 21,2 | 46,7 |
Média | 87,7 | 15,4 | 16,5 | 21,7 | 41,7 |
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Bernardino de Lima et al. (2009) | 96,7 | 11,1 | 56,0 | – | – |
Miller et al. (2009) | – | 13,0 | 44,0 | – | – |
Custódio et al. (2010) | 95,0 | 11,0 | 55,0 | – | – |
Média | 95,9 | 11,7 | 51,7 | – | – |
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Valadares Filho et al. (2006) | 90,16 | 10,85 | 1,29 | – | – |
Fonte: Adaptado de Araújo, 2012
Os lipídios fornecem 2,25 vezes mais energia para os animais do que carboidratos e proteínas. Por esse motivo, o elevado teor de lipídio faz do gérmen integral de milho um alimento que promove o aumento da densidade energética da dieta, sem a necessidade de elevar o consumo de carboidratos fermentáveis no rúmen (concentrado), evitando possíveis problemas metabólicos (acidose, por exemplo) devido à queda do pH ruminal.
Fontes de gordura também podem ser usadas de forma estratégica, em situações de baixa ingestão de matéria seca, como, por exemplo, nas chamadas “dietas de verão”, utilizadas em ambientes com elevada temperatura (realidade muito comum no Brasil), ou ainda em situações de estresses do animal. Isso porque o incremento calórico dos lipídios é mais baixo do que carboidratos e proteínas, ou seja, promove uma menor produção de calor durante o consumo e digestão de alimento pelo animal.
Se por um lado, substituir milho por gérmen na dieta diminui o risco de acidose pela menor fermentação de amido, por outro, o excesso de óleo pode ser prejudicial às bactérias do rúmen.
Os benefícios desse insumo, aliado, muitas vezes, ao seu preço no mercado, podem levar a um fornecimento exagerado de gérmen aos animais, o que poderá prejudicar o desempenho. Isso porque o excesso de lipídio em dietas de ruminantes é tóxico para protozoários e bactérias gram-positivas, incluindo bactérias celulolíticas, o que prejudica a digestão das fibras da dieta e, como consequência, redução do consumo de matéria seca e desempenho dos animais. Além disso, o excesso de gordura recobre a partícula de alimento, reduzindo o contato dos microrganismos com a fração alimentar, o que prejudicará sua digestão. Ao fornecer fontes de gordura para bovinos de corte, o ideal é não ultrapassar 6% de extrato etéreo na dieta e, em se tratando de gérmen de milho integral, a inclusão máxima desse insumo deve ser aproximadamente 30% na matéria seca.
Precisamos pensar ainda que, a substituição de parte do milho por gérmen necessita de um ajuste de formulação relacionada à proteína degradável no rúmen (PDR). Temos que, a exigência de PDR se dá em função do crescimento microbiano, e este aumenta em função da quantidade de carboidrato fermentável no rúmen. Ao diminuir a quantidade de milho na dieta, com a inclusão de gérmen, ocorre um decréscimo na quantidade de carboidrato chegando ao rúmen e um aumento da quantidade de gordura, que não é digerida pelos microrganismos. Desse modo, quando o gérmen é incluído na dieta, em substituição ao milho, podemos trabalhar com menor inclusão de ureia ou de fontes de proteína verdadeira, como, por exemplo, farelo de soja, o que poderia refletir em uma redução nos custos de produção.
Ponto de atenção:
Cuidado ao armazenar o gérmen de milho integral na fazenda!
Por ser um insumo com elevado teor de óleo, se armazenado por longos períodos e em condições de elevada temperatura e umidade, pode rancificar, o que prejudicará sua palatabilidade e, como consequência, o consumo e desempenho dos animais.
Por fim…
O gérmen de milho integral é uma boa fonte alternativa de energia para bovinos de corte, porém sua inclusão na dieta deve ser feita de forma correta e equilibrada, levando em consideração sua composição, a dieta que será trabalhada e o preço do insumo, visando não prejudicar o desempenho zootécnico e financeiro da operação.
Muito bom o artigo.