Estamos presenciando um dos momentos de maiores custos de formulação para aves. Acontecimentos econômicos e demanda de mercado influenciaram na alta dos preços do milho e, principalmente do farelo de soja (mercado externo). Previsões de mercado sugerem que estes altos preços de matérias-primas perdurarão.
Apesar da alta nos preços do milho, o aumento dos preços do farelo de soja fez com que este ingrediente passasse a representar um custo muito mais significativo do que antes na formulação. O farelo de soja, principal fonte de proteína das rações, no qual, em cenários normais, representava 17% do custo total da formulação, hoje equivale aproximadamente 25%, ou seja, um aumento de representatividade de custo na fórmula de quase 150%, conforme tabela 1 abaixo (tomando como exemplo uma ração fase de crescimento de frangos de corte):
Out/19 | Nov/20 | % R$ Ração out/19 | % R$ Ração nov/20 | |
Milho | R$ 714.00 | R$ 1200.00 | 46% | 48% |
Farelo de soja | R$ 1134.00 | R$ 2800.00 | 17% | 25% |
Óleo degomado | R$ 3500.00 | R$ 5750.00 | 9% | 9% |
Tabela 1. Preços de MPs em outubro de 2019 e novembro de 2020. Proporção de custo das MPs em uma ração crescimento de frangos de corte nos dois cenários de preços apresentados.
Junto ao farelo, outra matéria-prima derivada da soja que impacta muito nas formulações é o óleo degomado. Mesmo em um ano recorde de produção da soja, indústrias alimentícias relatam não conseguir competir com as indústrias de biodiesel nas aquisições de óleo. Segundo o Cepea, o óleo está sendo ofertado – atualmente – acima dos R$ 7.000,00 a tonelada. Cenário não visto desde 2002. Isso representa um aumento de 74,5%, comparado aos valores que eram praticados em setembro do ano passado.
Com todo esse aumento nos preços das matérias-primas, as formulações nunca estiveram custando tanto aos produtores. Exemplo (gráfico 1) abaixo:
Diante deste cenário, gostaria de colocar para reflexão alguns pontos e alternativas. Com o aumento dos preços das três principais matérias-primas da formulação, as quais representam os custos dos dois principais nutrientes (proteína bruta e energia metabolizável) das fórmulas, o peso do custo da relação entre estes dois nutrientes também se alterou. Ou seja, quando comparamos a proporção do aumento de custo da PB em relação a energia temos um aumento de 79%, comparado ao passado que era de 55%, conforme tabela abaixo:
Out/19 | Nov/20 | |
Investimento em 0,1% PB, em relação a 10kcal | 55% | 79% |
Out/19 | Nov/20 | |
Investimento em 10kcal | R$ 5.64 | R$ 9.40 |
Investimento em 0,1% PB | R$ 3.13 | R$ 7.43 |
Nestes exemplos a fórmula referência é a fase de crescimento para frangos de corte, com 3260kcal e 20% PB, com uma lisina digestível de 1.07%. De acordo com os preços das matérias-primas da tabela 1, o investimento em 10kcal representava R$ 5,64/ton. de ração, e aumentar a lisina digestível de 1.063% para 1.07%, aumentando consequentemente a PB em 0,1% (ou seja de 19.9% para 20%), custava R$ 3,13/ton. de ração. Com os preços apresentados em novembro 2020, o investimento em 10kcal passou a representar R$ 9,40/ton. ração e aumentar em 0,1% de PB, com o incremento de lisina digestível, passou a representar R$ 7,43/ton. ração. Desta maneira, faz se necessário que os nutricionistas encontrem alternativas dentro das formulações levando em consideração a mudança de representatividade de custos entre os nutrientes.
Quanto as alternativas para redução de custos, além das alterações nutricionais, podemos fazer uso das enzimas disponíveis no mercado, principalmente as proteases, pensando no alto custo do farelo de soja. As proteases, desde que seja utilizada sua matriz nutricional adequada, trazem ótima relação custo-benefício. As carboidrases como amilases e xilanase, atuam no intuito de reduzir a inclusão dos óleos na formulação, trazendo economia, sem perdas de desempenho, dependendo do nível energético utilizado nas formulações.
Importante ressaltar que, nada adianta fazer uso destes aditivos enzimáticos disponíveis no mercado, se não há um controle de qualidade rigoroso na entrada das matérias-primas para produção de rações e em seu processo de fabricação. Como exemplo: é incoerente falar de uso de uma enzima para melhorar digestibilidade de energia, se recebemos uma matéria-prima fonte de energia peroxidada. Uma gordura peroxidada pode resultar em perdas de até 90kcal da energia metabolizável. Faria sentido usar um “blend enzimático” para fornecer estas mesmas 90kcal? Que economia seria esta? Ficaria “no papel” apenas… o que não impactaria no bolso do produtor. Ou seja, mesmo com os altos custos de matéria-prima, esta não é a hora de flexibilizar ou renunciar à qualidade dos ingredientes.
O trabalho de base de qualidade dos ingredientes, classificação de fornecedores e atualização de matrizes nutricionais, de forma segura, permite ao nutricionista reduzir ou até mesmo extinguir o “coeficiente de segurança” durante as formulações, trazendo ainda mais economia, sem perda de desempenho. É preciso realizar o ajuste fino na atualização das matrizes nutricionais para conseguir usufruir ao máximo o potencial destes ingredientes.
Produtores que possuem produção própria do óleo de vísceras para substituir o óleo degomado ganham vantagem diante do cenário atual, assim como a maior inclusão das farinhas de origem animal, tanto para diminuir a inclusão dos óleos como para reduzir a inclusão do farelo de soja na formulação.
Durante o verão, além desse aumento dos preços das matérias-primas, temos também o aumento da temperatura ambiente (que impacta no desempenho das aves), o que induz a necessidade de trabalharmos com níveis energéticos mais altos nas formulações, elevando assim – ainda mais – os custos. Mas e se tivéssemos aviários adequados em ambiência? Provavelmente o incremento energético nas formulações seria muito menor, o que proporcionaria uma redução de custos das rações, com o mesmo desempenho das aves. O investimento em ambiência parece ser muito significativo, porém, seus ganhos em economia com níveis nutricionais trazem o retorno em muito pouco tempo e perduram para sempre – desde que bem planejados -, independente da época do ano.
Outro ponto que não poderia deixar de citar é quanto ao investimento em silos de armazenagem. Quantos produtores devem estar refletindo sobre a necessidade dessa ferramenta tão importante? Quanta economia poderiam ter neste momento de alta dos grãos? Qualquer investimento em silos teria sido pago em poucos meses. Sem contar o uso estratégico dos mesmos, pois conhecendo o nível nutricional das matérias-primas dos diferentes fornecedores, e alterando a matriz nutricional, é possível economizar tanto quanto utilizar ingredientes alternativos, que estão disponíveis apenas em determinadas épocas do ano.
Falando em ingredientes alternativos (milheto, sorgo, DDG, etc.) estes também seriam uma boa oportunidade de economia, desde que estivessem disponíveis para todos. Importante analisar e conhecer a matriz nutricional de cada um deles, para proporcionar economia de forma segura.
Outro ponto a analisar é que, quanto mais caro os preços das matérias-primas, mais caro é produzir o kg do frango pesado. Sabemos que conforme a idade avança a conversão alimentar piora, desta forma, uma alternativa seria estudar o peso de abate como forma de economizar matéria-prima, ou seja, reduzir a idade de abate. Isso dependeria da capacidade do abatedouro, o qual precisaria estar ocioso, pois para se obter a mesma rentabilidade seria necessário alojar mais aves por m², com menor peso, para não ultrapassar a quantidade mínima de kg/m² e correr o risco de perder desempenho. Outra alternativa, é buscar a relação custo x benefício nos níveis nutricionais utilizados para conquistar um melhor ganho de peso diário com o intuito de reduzir a idade de abate das aves.
O atual cenário em que vivemos não deixa espaço para erros básicos de manejo, regulagem de comedouros, desperdícios de rações, fornecimento de água de má qualidade e problemas sanitários. Não é hora para deslizes! O investimento em nutrição, para encobrir estes erros, nunca pagou a conta. Imagina com os altos custos de formulação que temos hoje? Com tantas tecnologias disponíveis para se obter uma alta produtividade, seja em aditivos nutricionais, equipamentos ou instalações, precisamos entender que alternativas isoladas não farão milagres. Temos sempre que nos lembrar do trabalho de base, da importância de todos os pilares (nutrição, genética, manejo, sanidade e ambiência) para que nos tornemos ainda mais competitivos no mercado, independente dos fatores externos.