Genética aliada à nutrição
Quando pensamos em sustentabilidade econômica da atividade pecuária, uma das primeiras palavras que nos vem à cabeça é competitividade. Acontece que, caso a atividade não seja competitiva frente a outras práticas agropecuárias, certamente o produtor se sentirá desestimulado e, consequentemente, deixará a atividade, seja por ineficiência produtiva ou simplesmente abandono. Nesse sentido, uma propriedade rural deve operar com foco em resultados obtidos a partir da equalização de matérias primas de qualidade, do controle dos processos produtivos e utilização de tecnologia.
Nosso foco hoje será discutir sobre uma das principais matérias primas a serem trabalhadas porteira a dentro: o animal.
Quando olhamos à nossa volta, notamos a existência de inúmeras raças, com diferentes aptidões e propósitos, as quais, como técnicos, precisamos avaliar com base nos critérios específicos, buscando características desejáveis para o sistema de produção, que nos mostram o melhor conjunto genético a ser trabalhado. Nesse momento, precisamos deixar a “paixão” de lado.
Pensando em conjunto genético, temos dois caminhos que podemos trabalhar, com o objetivo de melhorar a qualidade da matéria prima – o animal – a ser utilizada na fazenda. O primeiro é a busca por animais superiores, obtidos a partir de programas de melhoramento da genética, e o segundo seria a exploração do cruzamento de raças.
Quando pensamos em acasalamento entre animais de raças distantes, buscamos explorar um fenômeno genético conhecido como heterose, ou vigor híbrido. Neste, os filhos provenientes de cruzamentos de duas raças apresentam desempenho superior (mais vigor ou maior produção) à média de seus pais. Podemos destacar que, quanto mais diferentes forem a genética das raças ou linhagens envolvidas no cruzamento, maior será a heterose.
Os ganhos atribuídos ao efeito da heterose ocorrem pela conjunção de fatores gerados pelo vigor híbrido, os quais têm influência positiva e direta, capaz de melhorar o desempenho das características produtivas, como peso ao desmame e antecipação da idade de abate, com incremento do rendimento e acabamento de carcaça nos machos e fêmeas; assim como a melhoria significativa dos índices reprodutivos, como fertilidade e habilidade materna nas fêmeas. Tudo isso sem perder a tão necessária rusticidade e adaptabilidade ao ambiente tropical.
Um cruzamento que vemos ganhar cada vez mais espaço nas diferentes regiões brasileiras, é o Nelore X Angus. Nesse caso, busca-se a adaptabilidade e resistência do Nelore ao ambiente tropical e a precocidade e desempenho do Angus, já que os animais oriundos deste cruzamento possuem um grande potencial produtivo. Existem inúmeras outras combinações que podem ser feitas, no entanto, o ponto fundamental a ser considerado é o propósito a ser explorado nas crias.
Até aqui tudo perfeito, porém, existe um grande perigo que a maioria dos pecuaristas, por negligência, acabam se sujeitando e comprometendo os resultados. Vejamos.
Ao trabalhar com um animal geneticamente superior, precisamos ter ciência de que precisaremos de um pacote nutricional à altura do potencial de ganho desses animais. Pense comigo: de nada adianta uma enorme capacidade genética, sem as condições necessárias para explorá-las.
Para exemplificar: imagine que você adquira um carro muito potente (uma Ferrari, por exemplo), e abasteça-o com uma gasolina batizada – ou adulterada. Você acredita mesmo que ela apresentará seu desempenho máximo? Muito provável que não. Nesse caso, se o nosso combustível não é dos melhores, a opção mais sensata seria optarmos por um carro que exija menos, ou seja, um de menor potência.
O que quero dizer é: se não temos um programa nutricional adequado, que permita explorar o potencial de ganho de peso de um animal superior, seja ele oriundo de um programa de melhoramento da genética ou de um cruzamento que buscou explorar a heterose, corremos o risco de perder a oportunidade de produzir mais e, nesse caso, até perder dinheiro, visto que esses animais normalmente apresentam maior custo de reposição.
Me lembro bem quando – no início dos anos 2000 – se falava muito em cruzamentos, na utilização de várias raças, etc. Nessa época, pude acompanhar a queda de alguns projetos pecuários. Certamente, o erro comum a todos eles foi acreditar que a melhora genética resultaria em aumento de produtividade, esquecendo que essa resposta é dependente de um bom pacote nutricional.
Sendo assim, antes de definir a matéria prima que será trabalhada, devemos fazer uma avaliação muito sensata da estrutura da fazenda, buscando definir a capacidade de intensificação da propriedade, para então buscarmos o melhor padrão de animais a serem trabalhado.
Por fim, temos que pensar no custo adicional de um animal superior (ágio), e no resultado a ser obtido com ele. Certamente, esse animal terá um maior potencial de ganho, o qual será expressado – somente – frente a um planejamento nutricional adequada. Caso contrário, se não explorarmos essa “janela que se abre”, o ágio pago passa a ser um custo desnecessário porteira a dentro.
O mesmo raciocínio pode ser aplicado para validar fornecedores de bezerros, pois sabemos que existem diferentes animais – matérias primas – ofertadas no mercado, e nem todos apresentam o mesmo desempenho.
Para pensar: se o desembolso com os custos fixos e a nutrição serão os mesmos, qual animal permitirá maior ganho econômico?