A silagem de milho é a principal forragem utilizada na dieta de ruminantes confinados no Brasil, e isso ocorre porque a cultura do milho possui características que a levaram a ser o volumoso de eleição entre os produtores de bovinos de leite. Algumas dessas características são:
- alta produtividade de matéria seca por área,
- alta produção de energia e/ou amido por kg/MS,
- ampla variedade de híbridos no mercado com adaptabilidade a diversos climas e regiões,
- alta capacidade de intervenção técnica,
- possibilidade de resistência e tratamento a pragas e doenças e
- boa digestibilidade da fibra, gerando alto valor nutricional.
Hoje em dia, principalmente em rebanhos leiteiros de alta produção e eficiência, observamos uma tendência em trabalhar dietas com inclusão de forragem elevada na busca de maior saúde ruminal, produção de sólidos, longevidade entre outros.
Porém, para associar saúde, produção e dieta de alta forragem é necessário se obter uma silagem de milho de ótima qualidade, que permita seu consumo e forneça o aporte de nutrientes exigidos pelos animais.
A produção de silagem de milho com alto valor nutricional inclui praticamente três fatores principais:
- alta densidade energética,
- alta digestibilidade do amido e
- boa digestibilidade da FDN.
Teor de Amido
Para produzir uma silagem de alta densidade energética é necessário que ela possua teor de amido elevado, ou seja, a lavoura de milho precisa produzir bastante grãos, sendo este o primeiro requisito na escolha do híbrido.
O amido é a principal fonte de carboidratos para síntese de proteína microbiana no rúmen (figura 1.) e precursor de glicose para a vaca. Portanto, é um nutriente indispensável para a produção de leite e manutenção do animal.
Com as produtividades dos híbridos de hoje em dia, podemos considerar que um teor de amido alto na silagem seria acima de 30% na matéria seca, o que já não é tão raro de se encontrar atualmente. Além da escolha de um híbrido de alta produção de grãos, outras estratégias podem ser adotadas para produzir alto amido, como elevação da altura de corte, colheita mais tardia, entre outras.
As dietas de vacas leiteiras de alta produção geralmente possuem de 20 a 30% de amido. Portanto, quanto maior for o teor de amido da forragem, menos necessário será a suplementação de milho oriundo da ração, ou seja, menor gasto com concentrado e menor custo alimentar por vaca/dia.
No cenário atual de preços de milho, cada ponto percentual de amido na silagem pode representar em torno de 200 a 300 G de milho moído a mais ou a menos na dieta para se obter o mesmo teor de amido final. Em outras palavras, considerando-se a mesma dieta e o preço do milho em torno de R$ 1,50/kg, uma silagem com 20% de amido pode representar um custo alimentar de R$ 3,00 a R$ 4,50 por vaca/dia maior quando comparado à uma silagem com 30% de amido.
Conforme já mencionamos anteriormente e demonstrado no gráfico acima, o amido é responsável pela maior produção de proteína microbiana no rúmen, e esta última, por sua vez, é a principal fonte de aminoácidos para vacas leiteiras. Portanto, nas dietas de animais de alta produção sempre se busca a otimização da síntese de bactérias no rúmen.
Para isso, é necessário fornecer o maior aporte de carboidratos possível, principalmente amido, disponíveis à degradação pelas bactérias, ou seja, o amido precisa ter alta taxa de degradação e exposto/acessível aos microrganismos do rúmen.
Digestibilidade do Amido
Contudo, não menos importante que o teor de amido na silagem, é a sua digestibilidade, onde quanto maior, mais leite produzido (gráfico 2).
Sendo assim, no processo de escolha do híbrido é extremamente importante avaliar o grau de vitreosidade do endosperma do grão, ou em outras palavras, se o grão é duro ou macio, endosperma vítreo ou farináceo.
Grãos mais vítreos possuem maior matriz proteica entre os grânulos de amido, conforme demonstrado na foto microscópica abaixo, formando uma “parede” densa e dificultando o acesso das bactérias para a degradação (figura 3.).
Os grãos menos vítreos, ou farináceos, possuem os grânulos de amido mais espaçados e menos quantidade de matriz proteica entre eles, facilitando a sua degradação (figura 4).
Outro fator importante com relação à vitreosidade do grão refere-se ao processamento no momento da colheita do milho. Híbridos que possuem grãos mais macios certamente serão processados mais facilmente, seja a colheita realizada com máquinas que possuem processador de grãos, ou não.
Digestibilidade da Fibra
Outro ponto importante a ser considerado na silagem de milho é a digestibilidade da fibra. Na nutrição de ruminantes consideramos a fração fibrosa como FDN (fibra em detergente neutro), que é composta basicamente por carboidratos estruturais, celulose, hemicelulose e lignina, que sustentam as células vegetais da planta do milho.
A fibra tem um papel importante na nutrição de ruminantes:
- sendo responsável pela manutenção da saúde ruminal através da ruminação, promovendo o tamponamento do rúmen, e
- sendo mais uma fonte de energia para a vaca.
As bactérias do rúmen são capazes de promover a hidrólise dos polissacarídeos que compõem a FDN convertidos em ácidos graxos voláteis (AGV), que serão absorvidos na parede do rúmen como fonte energética.
Dentre os polissacarídeos citados acima, a lignina é a fração menos digerível/degradável da FDN, enquanto a celulose e a hemicelulose possuem taxa de degradação variável de acordo com a forragem, consumo e o animal.
Logo, é sabido que quanto maior o teor de lignina em determinada forragem, menor será a digestibilidade da FDN dela. Portanto, híbridos que geneticamente possuem menor teor de lignina irão apresentar maior digestibilidade de fibra (figura 6).
Dietas com alta forragem requerem a fração FDN mais digestível para evitar redução no consumo de matéria seca e produção de leite (Miller et al, 2021). No mesmo estudo, foi observado que quando utilizado híbrido de nervura marron (baixa lignina) em dietas de alta forragem, conseguiu-se manter a produção de leite, sólidos e consumo de matéria seca, quando comparados à dieta com teor de FDN mais baixo. Em dietas de alto teor de FDN, porém com forragem de baixa digestibilidade, geralmente perdemos desempenho.
Geralmente, os híbridos de milho que possuem grãos farináceos tendem a acumular menos lignina na sua composição da FDN. Sendo assim, ao selecionar híbridos de grãos macios também poderemos estar selecionando para uma boa digestibilidade de fibra.
Existem outras estratégias que podem aumentar a digestibilidade da FDN, como aumentar a altura de corte na lavoura, como demonstrado no gráfico acima.
Outro ponto é a maturidade da planta, pois quanto mais madura, mais lignina é acumulada na parede celular da fração fibrosa, conforme demonstrado no gráfico abaixo (figura 7).
E, por último, o manejo de controle de pragas e doenças que podem reduzir a digestibilidade da fibra, como por exemplo a infestação por fungos que causam a perda de umidade da planta precocemente.
Portanto, podemos considerar os três pilares na escolha do híbrido para confecção de uma boa silagem de milho.
- Teor de amido
Quanto maior for o teor de amido, maior será a densidade energética (mcal/kg) da silagem e, portanto, menor gasto com concentrados energéticos reduzindo o custo alimentar.
- Digestibilidade do amido
Quanto maior a disponibilidade do amido no rúmen do animal, mais eficiente será a síntese de proteína microbiana e, consequentemente, a produção de leite, sólidos e eficiência alimentar. Além disso, vale lembrar que híbridos de grãos macios serão mais facilmente processados na colheita.
- Digestibilidade da fibra
Quanto maior for a digestibilidade da fibra, maior a possibilidade de inclusão da forragem na dieta, promovendo mais saúde para o animal e menor custo alimentar. Também mais nutrientes serão disponíveis no rúmen gerando mais energia disponível para lactação.